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Por Yuri Almeida 

O processo de independência de um país tem, como um dos pilares, o estabelecimento de símbolos, que traduzem o sentimento popular, gera pertencimento e organiza valores da sociedade. Hinos, bandeiras e conceitos são exemplos desses símbolos. Assim, o marketing político disputa além das narrativas, também esses símbolos.



Como lembra Benedict Anderson, em Comunidades Imaginadas (1983), “as nações são comunidades políticas imaginadas porque, mesmo sem que seus membros se conheçam, compartilham símbolos, ritos e narrativas que os unem em um sentimento de pertencimento”. Nesse sentido, os símbolos nacionais são mais do que ornamentos: são a matéria-prima da identidade coletiva.

Os movimentos fascistas em todo mundo — e aqui no Brasil, o bolsonarismo — sequestraram os símbolos nacionais e as cores como identidade do seu projeto político. Bolsonaro bradava: “que a nossa bandeira jamais será vermelha”, em contraponto à cor adotada pelo Partido dos Trabalhadores.

Vestir verde e amarelo, até então, era sinônimo de estar ao lado de Bolsonaro. O PT, nas eleições seguintes, ficou mais colorido e, após a vitória de Lula em 2022, voltou a disputar o verde e amarelo. Sob o slogan “União e Reconstrução” (recentemente atualizado para “do lado do povo brasileiro”), a comunicação institucional do Governo Federal buscava apaziguar a polarização política no Brasil.

Como afirma Norberto Bobbio, em Direita e Esquerda (1994), “a luta política é também a luta pelos signos e pelas palavras, pois nomear é já definir um campo de batalha”. O embate, portanto, não é apenas programático, mas semântico e simbólico.

Três fatos modificaram, radicalmente, as narrativas pela disputa dos símbolos nacionais:

1- A família Bolsonaro, temendo a condenação de Bolsonaro, o pai, articula retaliações econômicas e militares dos Estados Unidos contra o Brasil. Tal estratégia coloca a soberania em risco e deixa a base bolsonarista em dúvida: “Não era o Brasil acima de tudo?”

2- A continência à bandeira norte-americana e a bandeira gigante nas manifestações do 7 de Setembro na Avenida Paulista depõem contra o bolsonarismo também pela troca do verde e amarelo da bandeira brasileira pelo vermelho, azul e branco da bandeira dos Estados Unidos.

3- A atualização do slogan do Governo Federal e a defesa da soberania nacional pelo presidente Lula, no caso do Tarifaço de Trump, reposicionam as narrativas da esquerda no campo do patriotismo, do uso do verde e amarelo e dos símbolos nacionais, ao lado das narrativas da luta de classes (nós x eles).

Como já advertia Ernesto Laclau, em A razão populista (2005), a política contemporânea opera por meio da construção de cadeias de equivalência simbólicas, capazes de transformar significantes flutuantes — como “povo”, “nação”, “pátria” — em centros de identificação política. No Brasil, o verde e amarelo deixa de ser monopólio da direita e retorna ao campo da disputa aberta.

A disputa pelos símbolos nacionais é, em última instância, a disputa pela alma da política. Se o bolsonarismo tentou fixar o verde e amarelo como exclusividade de seu projeto autoritário, a realidade mostrou que a bandeira brasileira não pertence a um grupo político mas à totalidade do povo. Como lembrava Maquiavel em O Príncipe (1513), “o povo deseja não ser oprimido”, e esse desejo se traduz também no direito de reivindicar seus símbolos como patrimônio comum.

Ao recuperar o verde e amarelo sob a bandeira da soberania, da democracia e da justiça social, o campo progressista reposiciona a política não apenas como luta de classes, mas também como luta pelo imaginário coletivo. A provocação do título deste artigo “a nossa bandeira jamais será vermelha, branca e azul” sintetiza essa virada: reafirma que o Brasil não é colônia, não é extensão de outro projeto nacional e não se ajoelha diante de símbolos estrangeiros.

Em tempos de polarização, o desafio não é apenas governar, mas reconstruir o significado da nação. Afinal, como dizia Antonio Gramsci, em seus Cadernos do Cárcere, “a crise consiste justamente no fato de que o velho está morrendo e o novo não pode nascer: neste interregno, aparecem os mais variados fenômenos mórbidos”. É nesse espaço que os símbolos se tornam armas.

Assim, a política brasileira entra em um novo ciclo: aquele em que o verde e amarelo, longe de ser sequestrado por movimento político, volta a tremular como bandeira de um povo que reivindica sua soberania e sua democracia.

Yuri Almeida é professor, estrategista político e especialista em marketing eleitoral.



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Resumo das Políticas

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